En cuanto a la relación lengua/arraigo, ¿comparte la postura del novelista carioca Per Johns: "El arraigado es uno con su lengua. El bilingüe es dos y ninguno"?
Este é um ardil. Pobre poliglota, o que seria então? (risos) Evidente que a língua nos distingue, nos permite a multiplicidade cultural, por exemplo. Porém a diversidade de caráter percebido dentro de uma mesma comunidade lingüística nos leva a pensar que falta algo na consideração do Per Johns. De uma maneira geral somos dois e nenhum independente da condição bilíngüe. Somos dois e nenhum porque a realidade em nosso tempo, particularmente em nossos países, nos leva a uma condição existencial no mínimo ambígua. A rigor, nos leva a um esfacelamento do caráter. Vivemos em sociedades atônitas que não sabem (mais) dar uma resposta equilibrada à avalanche de ansiedades que nos são cotidianamente impostas. De alguma maneira, o grande exílio hoje se verifica dentro da língua, ou mais: dentro do ambiente cultural em que age cada língua.
¿Cómo se despierta su interés por la traducción? ¿Responde, de alguna manera, a sus vinculaciones con la literatura en español?
Sim, eu comecei a traduzir exatamente do espanhol, motivado por uns livros que ganhei de presente cujos autores eram desconhecidos no Brasil. Foi meu primeiro impulso: traduzir alguns poemas para publicar na imprensa em meu país. Não recordo bem se César Vallejo ou Vicente Huidobro ou Oliverio Girondo. Logo surgiram possibilidades de traduzir autores ingleses, italianos e galegos. Aos poucos fui conhecendo melhor o idioma espanhol e, sobretudo, me apaixonando pela diversidade estética de suas literaturas, algo impressionante. Até que passei a traduzir somente do espanhol, já com um propósito distinto, que assumia uma conotação política e me distanciava da condição de tradutor apenas em seu âmbito mercadológico, de contrato editorial. Eu quero recordar aqui uma aventura que foi de grande importância para mim: quando eu morava em São Paulo, na primeira metade dos anos 80 do século passado (ah como é estranho falar em século passado), tive a ousadia de propor a um grande poeta do meu Estado (Ceará), Francisco Carvalho (1927), um exercício de tradução que, a rigor era um exercício de convívio mais intenso com a obra em questão, do livro Altazor, do chileno Vicente Huidobro. Carvalho é um poeta fundamental, cuja poesia foi de grande importância em minha adolescência, de maneira que sua concordância possuía para mim um significado à parte. Ao longo de alguns meses traduzimos os 7 cantos de Altazor, conversamos a respeito etc. Jamais pensamos em publicar o livro. Para nós, o que estávamos ali realizando era um ritual de intensificação de nosso conhecimento do espanhol e da poesia em si. Foi uma valiosa experiência.
¿Desde cuándo y por qué ha establecido vínculos con escritores de habla española?
Vamos diversificar o sentido do que chamas “vínculos”. Há o sentido do conhecimento através da leitura, assim como outros: o convívio pessoal, a correspondência epistolar e até mesmo a aproximação por natureza contratual. Na infância não era comum acesso a literatura de língua espanhola, de maneira que demorei muito a conhecer qualquer literatura neste idioma. Seguramente Cervantes foi o primeiro. Porém o impacto maior foi quando li Federico García Lorca. Li Pablo Neruda antes, porém não me causou a mesma impressão. É curioso que eu tenha lido primeiramente, em português, autores que depois foram traduzidos por mim. Dois exemplos: o próprio García Lorca e o cubano Guillermo Cabrera Infante. Outro vínculo fundamental foi de natureza epistolar. Creio que o mais importante destaque aqui é minha extensa correspondência com o crítico espanhol Jorge Rodríguez Padrón, que me ensinou muito a respeito de poesia hispano-americana. A partir deste diálogo pude conhecer muitos autores, dando início a um extenso contato epistolar que define todo o trabalho que sigo realizando. Pela ordem, o último vínculo é o do abraço físico, da troca de olhares, da amizade finalmente conquistada e definida. Este vínculo não é possível sem a presença das viagens. Conheço praticamente todos os países de língua espanhola. E tenho me encontrado com inestimáveis expressões literárias desses países nos diversos encontros internacionais que compartilhamos. É fundamental destacar a existência desses eventos, que permitem o diálogo, a descoberta, a confirmação, a continuidade de uma série de projetos sem os quais nosso abismo cultural seria ainda mais intenso e violento. Ainda me indagas o motivo para tudo isto, para meu vínculo com esta literatura. Embora eu ache que está bastante implícito em nossa conversa destaco que havia uma biblioteca na casa de meu pai, que foi responsável pela minha formação literária em um primeiro momento, e que quando comecei a ouvir nomes da literatura de língua espanhola soavam estranhos para mim, todos desconhecidos. Isto significava uma falha de formação.
¿Cómo circula la poesía de expresión española, sobre todo la latinoamericana, en Brasil?
Não circula. A idéia de circulação é o primeiro equívoco que deve ser explicado. Editar e circular são duas coisas distintas. Creio que isto se passa em grande parte do mercado editorial no mundo. Por vezes temos um convênio que permite a edição de um livro. Porém o livro não circula, não há distribuição, ou divulgação ou venda. O autor está publicado no país, e até tecnicamente impedido de que volte a ser reeditado, porém sem circulação alguma. Isto é o que se passa com a grande maioria da literatura de língua espanhola no Brasil, ou seja, à exceção de casos como Jorge Luis Borges, não há circulação. Nada. É preciso insistir neste detalhe: não conhecemos no Brasil a grande literatura de língua espanhola, com sua extensa e intensa diversidade, de épocas, estilos e países. Nada. Algumas editoras se interessam pelo tema, porém há em muitos casos uma imensa dificuldade na negociação de direitos autorais com a família, quando se trata de autores mortos. Há um abismo cultural imenso entre nossos países. Uma possibilidade de se remediar tal situação? Apoio institucional. Não digo apoio financeiro isoladamente, mas sim, sobretudo, apoio na liberação de direitos autorais. A criação de co-edições entre editora brasileira e governo desses países, isto seria brilhante. Já avançamos algo no que diz respeito a uma parceria com Portugal. Há editoras brasileiras interessadas na criação de coleções dedicadas à literatura hispano-americana. Mas precisam de apoio institucional. Há que pagar direitos autorais, tradutores etc. Tudo isto é fundamental.
¿Más allá de las ferias de libros y las bienales de Literatura, hay un espacio dentro del campo cultural brasileño para la literatura escrita en español? ¿La academia brasileña la aborda como objeto de estudio?
Não, não temos a menor preocupação com o idioma espanhol, o que inclui sua literatura. Mesmo a atenção para acordos comerciais, acordos de fronteira, eles não consideram a importância do conhecimento da língua. A literatura em si é um objeto absolutamente à parte dentro deste ambiente de negociação de poderes de fronteira. Insisto no termo, porque não me parece que nossos países estejam interessados em uma vital cumplicidade de definição de espaço político de ação comum no sentido de auto-preservação da América Ibérica ou algo similar. O mercado editorial no Brasil tem uma única porta aberta: para o que reza a intempérie dos mercados editoriais na Espanha e Estados Unidos. Esta minha experiência como curador de uma Bienal Internacional do Livro no Brasil me diz – e lamento profundamente ter chegado a tal conclusão – que não há interesse algum entre nossos países por uma aproximação cultural. O governo venezuelano está possuído por uma obsessão de controle continental à qual ele não corresponde senão de maneira impositiva. O governo brasileiro, por sua vez, até hoje não percebeu a importância de um diálogo com a América Hispânica. A Academia, segundo, tua pergunta, é um esteio insignificante, ela não representa nada que não seja a definição de um programa de governo. Acaso imaginas a Academia Brasileira de Letras propondo cursos de língua espanhola e uma série de conferências com autores de língua espanhola? Há isto na Venezuela, em relação a escritores brasileiros? Há um Centro de Estudos Brasileiros na Embaixada do Brasil em Caracas. O que ele tem feito pela difusão da literatura brasileira na Venezuela? Há algo assim na Embaixada da Venezuela em Brasília? O que se tem promovido ali? A relação cultural entre nossos países é meramente retórica, querida. Devo agradecer imensamente aos esforços da Fundación Biblioteca Ayacucho, pela publicação de vários autores brasileiros. Devemos isto aos venezuelanos. Porém as nossas academias, que essencialmente são os nossos governos, não estão interessadas no assunto.
© Adlin Prieto, 2009
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